terça-feira, 23 de dezembro de 2008

JOSÉ SARAMAGO, SOBRE...

SEU PROCESSO CRIATIVO

Quando acabo um livro, não tenho qualquer idéia. Fico à espera que ressurja e até hoje, felizmente... Mas, enfim, chegará o dia em que se acabarão as idéias. E quando se acabam as idéias, acaba-se o escritor – se é que o escritor não se acabe antes que se esgotem as idéias.

O 'ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA'

O livro nasceu nas circunstâncias mais prosaicas que se podem imaginar. Estava num restaurante – casualmente estava sozinho – e, de repente, me fiz a pergunta ‘e se todos fôssemos cegos?’... e imediatamente encontrei a resposta, 'nós somos todos cegos'.

A MORTE DAS IDEOLOGIAS COMO IDEOLOGIA E O COMUNISMO

Em primeiro lugar, isso é uma ideologia, está claríssimo. Como seres finitos, não temos condições de declarar a morte de uma coisa ou de outra. Marx nunca teve tanta razão como hoje. Fui convidado para ir ao programa do Bernard Pivot. À certa altura, saiu a pergunta: ‘Como é que você, depois do muro de Berlim e do que se passou na União Soviética, continua a ser comunista?’. E eu, como nunca tinha pensado numa resposta diferente, disse: ‘Pronto, sou comunista, acabou. Sou uma espécie de comunista hormonal. O que é isso, comunista hormonal? É que eu nasci com um hormônio que faz crescer a barba, nasci com um hormônio que, queira ou não queira, faz de mim comunista. Ser comunista é um estado de espírito... E o que aconteceu na União Soviética foi que estavam a governar a União Soviética, pessoas que, desse estado de espírito, não estavam nada, nada aparelhadas. Tinham-no perdido, se alguma vez tiveram’.

A ADAPTAÇÃO DO 'ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA' PARA O CINEMA E A MÁQUINA CINEMATOGRÁFICA CAPITALISTA.

Vamos lá ser sérios. A edição também é uma máquina capitalista. Ou acha que há qualquer coisa fora da máquina capitalista? Fernando Meirelles sabe e pode confirmar que não interferi em rigorosamente nada do seu trabalho. Como não admito que interfiram no meu, também não interfiro no trabalho alheio. Quando eu percebi que havia uma intenção de se respeitar aquilo que o livro dizia e não transformar num objeto de consumo vulgar e grotesco, a partir desse momento, eles tiveram carta branca para fazer o que queriam.
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Trechos retirados da entrevista exibida no programa 'Entrelinhas' de 21.12.2008.

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