domingo, 27 de setembro de 2009

Perfeito!

ORION

A primeira namorada, tão alta
que o beijo não a alcançava,
o pescoço não a alcançava,
nem mesmo a voz a alcançava.
Eram quilômetros de silêncio.

Luzia na janela do sobradão.

Por Carlos Drummond de Andrade

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Angústia - 2

Nunca presto atenção às coisas, não sei para que diabo quero olhos (...). Sou uma besta. Quando a realidade me entra pelos olhos, o meu pequeno mundo desaba.
***
O que eu precisava era ler um romance fantástico, um romance besta, em que os homens e as mulheres fossem criações absurdas, não andassem magoando-se, sentindo vontade de se traírem. Histórias fáceis, sem almas complicadas.
***
Sentia vontade de chorar, tinha um bolo na garganta.
Por Graciliano Ramos, em 'Angústia'

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Trova

Comigo me desavim,
sou posto em todo perigo;
não posso viver comigo
nem posso fugir de mim.

Com dor, da gente fugia,
antes que esta assim crescesse:
agora já fugiria
de mim, se de mim pudesse.
Que meio espero ou que fim
do vão trabalho que sigo,
pois que trago a mim comigo
tamanho inimigo de mim?

Por Francisco de Sá de Miranda em Obras completas.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Só se acha o que se caça; o que negligenciamos nos escapa.


Fala do personagem Creon, em 'Édipo Rei', de Sófocles

Tradução de Trajano Vieira
Versão na íntegra para download em
http://letrasuspdownload.blogspot.com/2009/08/flc0113-livro-edipo-rei.html

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Nalgum lugar...

nalgum lugar em que eu nunca estive, alegremente além
de qualquer experiência, teus olhos têm seu silêncio:
no teu gesto mais frágil há coisas que me encerram,
ou que eu não ouso tocar porque estão demasiado perto

teu mais ligeiro olhar facilmente me descerra
embora eu tenha me fechado como dedos, nalgum lugar
me abres sempre pétala por pétala como a Primavera abre
(tocando sutilmente, misteriosamente) a sua primeira rosa

(...)

(não sei o que há em ti que fecha
e abre; só uma parte de mim compreende que a
voz dos teus olhos é mais profunda que todas as rosas)
ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão pequenas

Por E. E. Cummings
Tradução de Augusto de Campos
Do blog antoniocicero.blogspot.com