quinta-feira, 19 de junho de 2008

O Passo

Teu passo, inato ao meu silêncio,
beira sagradamente, a fio,
meu leito insone e, com imenso
vagar, vem vindo mudo e frio.

Sombra divina, forma pura:
Deus!... tudo o que de bom supus
- passo contido, que doçura! -
já se aproxima com pés nus.

Se, lábios entreabertos, frente
a mim, reservas ao desejo
que ocupa minha mente
este alimento que é teu beijo,

mantém o enlevo ainda à parte
(no doce impasse existo e passo),
pois, ao viver, só de esperar-te,
meu coração pôs-se em teu passo.

Paul Valéry

Por Nelson Ascher

Nenhum comentário: